TSE analisa reserva de recursos do Fundo Eleitoral e tempo médio de rádio para candidatos negros

Os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começaram a analisar consulta sobre a possibilidade de se reservar vagas e cotas do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC) para candidatos negros, a exemplo do que já ocorre para candidatas do sexo feminino. O tema foi abordado na sessão plenária administrativa realizada por videoconferência nesta terça-feira (30/6).

A primeira consulta foi feita ao TSE pela deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), que questionou se uma parcela dos incentivos à candidatura de mulheres que estão previstos na legislação brasileira poderia ser aplicada especificamente para candidatos negros. A parlamentar indagou se 50% das vagas e da parcela do FEFC que são destinadas às candidatas do sexo feminino poderia ser distribuído a candidatas negras, e se é possível haver reserva de vagas para candidatos da raça negra, sendo-lhes destinado 30% do FEFC e do tempo destinado à propaganda eleitoral no rádio e na televisão.

Racismo estrutural

Relator do processo, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do TSE, afirmou nas considerações iniciais do seu voto que a sociedade brasileira já amadureceu para admitir que a democracia racial que se acreditava existir no país não passa de uma ilusão. “O racismo brasileiro é estrutural. Isso significa que, mais do que um problema individual, o racismo está inserido nas estruturas políticas, sociais e econômicas, e no funcionamento das instituições”, afirmou Barroso.

Sobre os reflexos do racismo especificamente no âmbito político-eleitoral, o ministro citou que nas eleições gerais de 2018 47,6% dos candidatos eram negros, mas apenas 27,9% foram eleitos. Para ele, um dos fatores que comprometem a viabilidade das candidaturas de negros é o financiamento eleitoral.

Barroso observou que o empenho do TSE e do Supremo Tribunal Federal (STF) na aplicação dos percentuais previstos em lei para a campanha de candidatas mulheres surtiu efeitos práticos no cenário eleitoral de 2018. Ele informou que, naquela eleição, a receita média das campanhas femininas alcançou 62,4% do total destinado aos candidatos homens. Entretanto, segundo o ministro, os candidatos negros – especialmente mulheres – continuaram subfinanciados. Embora tenham respondido por 12,9% das candidaturas, as mulheres negras receberam 6,7% dos recursos apenas, mencionou.

“Se o racismo no Brasil é estrutural, é necessário atuar sobre o funcionamento das normas e instituições sociais, de modo a impedir que elas reproduzam e aprofundem a desigualdade racial”, concluiu o ministro.

Sobre o primeiro quesito, Barroso propôs que em vez de 50% dos recursos destinados a candidatas negras, como formulado na consulta, fosse observada a proporção entre candidatas negras ou brancas na distribuição dos recursos da cota de 30% do FEFC.

Quanto ao segundo quesito, relativo à reserva de cota de candidaturas para pessoas negras, o relator indicou que cabe ao Congresso Nacional, por via legislativa, criar os instrumentos legais para tal.

Propaganda eleitoral

Em relação ao tempo de propaganda eleitoral destinado a candidatos negros, Barroso respondeu que os recursos públicos do Fundo Partidário e do FEFC, bem como o tempo de rádio e TV, devem ser destinados às candidaturas de homens negros na exata proporção das candidaturas apresentadas pelas agremiações.

O ministro Edson Fachin acompanhou o relator, lembrando que a Constituição de 1988 institucionalizou os direitos humanos no Brasil, num contexto em que se reconhece a igualdade de gênero e de raças como elemento essencial para uma sociedade democrática. “Ações em prol da igualdade racial e de gênero devem ser respeitadas e buscadas como um fim preconizado pela ordem constitucional vigente”, afirmou.

Próximo a votar, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista dos autos, para melhor apreciar a matéria.

Dívidas de campanha

Outra consulta submetida ao TSE, feita pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), indagou sobre a obrigação de um partido político responder de forma solidária por dívidas de campanha contraídas por seus candidatos mesmo não tendo previamente concordado com as contratações.
Em seu voto, o relator da consulta, ministro Edson Fachin, disse acreditar que essa corresponsabilidade entre partidos e candidatos tem natureza excepcional, dependente de decisão específica dos órgãos diretivos da legenda. Ele também esclareceu que essa decisão é facultada aos partidos, não ocorrendo de maneira automática. Fachin julgou prejudicado o segundo quesito formulado pelo PRTB, sobre a responsabilidade sobre débitos relativos à campanha de 2018, por entender que ele versava sobre caso concreto, fora do escopo de uma consulta.